Planta tóxica pode ser a resposta para a criação do contraceptivo masculino

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 21 de janeiro de 2018 às 02:22
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:32
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Composto presente na planta utilizada por caçadores africanos para envenenar suas flechas pode ser a saída

Em 2017, um grande teste clínico de um contraceptivo injetável foi interrompido depois que homens reportaram sofrer mais efeitos colaterais do que o esperado, incluindo sérios problemas emocionais e alterações de humor – um voluntário chegou a cometer suicídio durante o estudo. Dada a dificuldade presente neste campo,  os autores de uma pesquisa publicada no Journal of Medicinal Chemistry dizem ter encontrado um potencial contraceptivo masculino, um composto presente no extrato de uma planta que caçadores da África há muito tempo usam para criar veneno para as pontas de suas flechas.

O extrato, conhecido como ouabain, inibe uma enzima chamada Na/K-ATPase que ajuda células a bombear sódio para fora e potássio para dentro por sua membrana. Apesar desse bombeamento de sódio e potássio ser encontrado em virtualmente qualquer tipo de célula, o efeito da ouabain é mais aparente em células cardíacas. Nestas células, inibir a enzima faz com que elas (e o coração) desacelerem. Por séculos isso fez da ouabain uma boa opção de arma letal.

Mas a ouabain também inibe o bombeamento de sódio e potássio em células de esperma maduro, o que os transforma em péssimos nadadores. Nossos corpos produzem uma versão natural da ouabain (em doses muito menores das encontradas nas flechas dos caçadores), e homens com alto nível do composto tendem a ter menor fertilidade, afirmam estudos. Isso faz da ouabain um atraente candidato a contraceptivo masculino, exceto pela possibilidade dele parar o seu coração caso você consuma muito do composto.

Para solucionar este problema, os pesquisadores alteraram a estrutura química da ouabain e criaram três compostos que parecem inibir o bombeamento apenas das células do esperma. Eles testaram o composto mais promissor em ratos vivos, e descobriram que ele tornava os animais inférteis em apenas três dias. Melhor ainda, é o fato que o composto não causou nenhum efeito colateral notável. E sua maneira particular para reduzir a fertilidade faz do composto um contraceptivo ideal.

Ele apenas inibe a mobilidade do esperma e não interfere no desenvolvimento, explica Gunda Georg, autora sênior do estudo e chefe do Departamento de Medicina Química na Universidade de Minnesota, em um email. “Portanto, é um agente muito seletivo”.

Mas é claro, como admite Georg e sua equipe, a descoberta é apenas prova de um conceito. Ainda há muitas questões sobre o composto criado pelos cientistas, sendo uma delas por quanto tempo o efeito do contraceptivo duraria em pessoas. A resposta ditaria então um cronograma de dosagem. Georg diz que sua equipe já está cuidando dos próximos passos e planeja experimentar a criação em testes de animais em acasalamento, que eles esperam completar ainda este ano. E se tudo correr bem – de novo, um grande “se” no mundo dos contraceptivos masculinos – eles esperavam começar os testes clínicos dentro dos próximos cinco anos.


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